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A relação de objeto : 1956-1957 PDF

229 Pages·1995·154.308 MB·Portuguese
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Jacques Laca n Jacques Lacan Esta mãe insaciável, insatisloil.i. MM I,HM, .1, quem se constrói toda a escalada da crlnn O SEMINÁRIO caminho do narcisismo, é alguém raal, ala «»!« ali e, como .todos os seres insaciado'. nl.i i1" cura o que devorar, quaerens qtit<ni ,/, livro 4 que a própria criança encontrou <>ui p » O SEMINÁRIO anular sua insaciedade simbólica,' v,n um a relação trar possivelmente diante de si como um.i l".. de objeto escancarada. [...] Aí está o grando |>KH<|I> •!" nos é revelado por suas fantasias, s< v [...] ele nos dá a forma essencial soh ,\n .1 apresenta a fobia. Reencontramos isso mr, i, mores do pequeno Hans. [...] Com o siipoii daquilo que acabo de lhes trazer hojo, vo. ..•. \... ver melhor as relações entre a fobia i', i i« > < são. [...] Eu até diria que o caso cio |>ni|ui • Hans será melhor interpretado por voe .<••. do i|n pôde ser feito por Freud. (Excerto do c.-. ii<iii ii, < * Mas a castração, não é atoa que se |><>n nlim de maneira tenebrosa, que ela tinha i.mi.. >. i cão com a mãe quanto com o pai. A c.r.liin ' 0} materna — como vemos na descrig.Hi d.t ilu cão primitiva — implica para a criam,.1 ,i i 5 bilidade dadevoração e da mordida, l osln MM anterioridade da castração materna, o a cmitm cão paterna é um seu substituto. (Excerto do capítulo X* n [No caso do pequeno Hans,] a transi ,u <•• que se verificará decisiva — [é] a d '« como desaparafusamento da banheira. l)« grrui para a outra, a relação entre os muda inteiramente. Não há semelhança morder gulosamente a mãe, apreendoí sua f ficação natural, até mesmo temer, om In H famosa mordida encarnada pelo cavalo, o i parafusar a mãe, desmontá-la, mobilizá-la se assunto, fazer com que ela entre também ISBN 85-7110-304-6 conjunto do sistema e, pela primeira vo/, um elemento móvel e ao mesmo tempo ni|uiv lente aos outros. 9" 788571 " 103047' (Excerto do capitulo XXI'i> ao de objeto J-Z-E| Jorge Zahar l A l it < n Jorge Zahar Editor CAMPO FREUDIANO NO BRASIL Jacques Lacan Coleção dirigida por Jacques-Alain e Judith Miller Assessoria brasileira: Angelina Harari O SEMINÁRIO livro 4 a relação de objeto Texto estabelecido por Jacques-Alain Miller Jorge Zahar Editor Rio de Janeiro livro 4 Título original: Lê Séminaire de Jacques Lacan a relação de objeto Livre iv: La relation d'objet (1956-1957) 1956-1957 Tradução autorizada da primeira edição francesa, publicada em 1994, por Éditions du Seuil, de Paris, França, na coleção Champ Freudien, dirigida por Jacques-Alain e Judith Miller Copyright © 1994, Éditions du Seuil Copyright © 1995 da edição brasileira: Jorge Zahar Editor Ltda. rua México 31 sobreloja Versão brasileira de 20031-144 Rio de Janeiro, RJ Dulce Duque Estrada tel.: (21) 240-0226 / fax: (21) 262-5123 e-mail: [email protected] site: www.zahar.com.br Revisão de Todos os direitos reservados. Angelina Harari A reprodução não-autorizada desta publicação, no todo ou em parte, constitui violação do copyright. (Lei 5.988) [Edição para o Brasil] Composição: TopTextos Edições Gráficas CIP-Brasil. Catalogação-na-fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ. Lacan, Jacques, 1901-1981 L129s O seminário, livro 4: a relação de objeto / Jacques Lacan; texto estabelecido por Jacques Alain-Miller; tradução, Dulce Duque Estrada. — Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1995 (Campo Freudiano no Brasil) Tradução de: Lê Séminaire de Jacques Lacan, livre iv: Ia relation d'objet (1956-1957) ISBN: 85-7110-304-6 1. Lacan, Jacques, 1901-1981. 2. Psicanálise, l. Miller, Jacques-Alain. II. Título. III. Título: A relação de objeto. CDD - 150.195 95-0034 CDU - 159.964.2 SUMARIO TEORIA DA FALTA DE OBJETO I. Introdução 9 II. As três formas da falta de objeto 24 III. O significante e o Espírito Santo 40 IV. A dialética da frustração 59 V. Da análise como Bundling e suas consequências 76 AS VIAS PERVERSAS DO DESEJO VI. O primado do falo e a jovem homossexual 95 VII. Bate-se numa criança e a jovem homossexual 112 VIII. Dora e a jovem homossexual 133 O OBJETO FETICHE IX. A função do véu 153 X. A identificação ao falo 167 XI. O falo e a mãe insaciável 182 A ESTRUTURA DOS MITOS NA OBSERVAÇÃO DA FOBIA DO PEQUENO HANS XII. Sobre o complexo de Édipo 203 XIII. Sobre o complexo de castração 220 XIV O significante no real 237 XV. Para que serve o mito 254 XVI. Como se analisa o mito 274 XVII. O significante e o chiste 291 XVIII. Circuitos 309 XIX. Permutações 326 XX. Transformações 344 XXI. As calças da mãe e a carência do pai 362 XXII. Ensaio de uma lógica de borracha 381 XXIII. "Me dará sem mulher uma progenitura" 400 ENVIO XXIV. De Hans-o-fetiche a Leonardo-no-espelho 425 Teoria da Falta de Objeto Mapa de Viena (Baedeker, 1905) 452 Nota 455 INTRODUÇÃO O esquema Z. O objeto perdido e reencontrado. Pérolas. O objeto, a angústia, o furo. O fetiche e o objeto fóbico. Vamos falar, este ano, de um tema a que a evolução histórica da psicanálise, ou o que se chama assim, poderia dar, de maneira articu- lada ou não, uma posição central quanto à teoria e à prática. Este tema é a relação de objeto. Por que não o escolhi, ao começarmos estes seminários, quando ele já era atual, preponderante, crítico? Precisamente pela razão que motiva a segunda parte de meu título: e as estruturas freudianas. Este tema, com efeito, só poderia ser tratado depois de se tomar uma certa distância da questão. Precisávamos, em primeiro lugar, nos interrogar sobre o que constitui as estruturas nas quais Freud nos mostrou que a análise se desloca e opera, muito especialmente a estrutura complexa da relação entre os dois sujeitos presentes na análise, a saber, o analisado e o analista. A isso é que foram consa- grados nossos três anos de comentários e de críticas aos textos de Freud, que recordo sucintamente para vocês. O primeiro ano tratou dos próprios elementos da conduta técnica do tratamento, isto é, as noções de transferência e de resistência. O segundo ano abordou a base da experiência e da descoberta freudianas, 10 TEORIA DA FALTA DE OBJETO INTRODUÇÃO 11 a saber, a noção do inconsciente, sobre a qual acredito ter-lhes mos- que dão a prevalência, na teoria analítica, à relação de objeto como trado bem que foi ela que impôs a Freud introduzir os princípios, primária, sem no entanto comentá-la mais extensamente. Volta-se a literalmente paradoxais no plano dialético, que figuram em Além do centrar nela a dialética do princípio do prazer e do princípio de reali- princípio do prazer. Finalmente, no decorrer do terceiro ano, dei-lhes dade, e funda-se o progresso analítico numa retificação da relação um exemplo manifesto da absoluta necessidade que existe de se isolar entre sujeito e objeto, considerada como uma relação dual, que seria essa articulação essencial do simbolismo que se chama o significante, — dizem ainda, falando da situação analítica — excessivamente sim- para compreender o que quer que seja, analiticamente falando, no ples. Pois bem, esta relação do sujeito com o objeto, que tende cada campo propriamente paranóico das psicoses. vez mais a ocupar o centro da teoria analítica, é ela mesma que vamos Ao fim desses anos de crítica, eis-nos, pois, armados de um certo pôr à prova. número de termos e de esquemas. A espacialidade destes últimos não A partir do momento em que a relação de objeto, como dual, se deve ser tomada no sentido intuitivo do termo "esquema", mas num refere precisamente à linha a-a' de nosso esquema, será possível a outro sentido, perfeitamente legítimo, que é topológico — não se trata partir daí construir de maneira satisfatória o conjunto de fenómenos de localizações, e sim de relações de lugares, interposição, por exem- oferecidos à nossa observação na experiência analítica? Pode este plo, ou sucessão, sequência. Nossa elaboração culmina num esquema instrumento permitir, por si só, responder pelos fatos? Pode o esquema a que podemos chamar o esquema, e que é o seguinte: mais complexo que lhe opusemos ser negligenciado, deverá ser ele até mesmo descartado? Que a relação de objeto se tenha tornado, ao menos aparentemente, (Es) S a ) outro o elemento teórico primeiro na explicação da análise, disso lhes darei um testemunho seguido numa obra coletiva publicada há pouco, à qual,'com efeito, o termo coletivo se aplica particularmente bem. Não posso dizer que os convido a penetrar nela. Ali vocês vão ver, do começo ao fim, a relação de objeto valorizada e promovida de uma maneira que, sem dúvida, nem sempre é muito satisfatória no sentido (eu) a A) (Outro) O ESQUEMA do articulado, mas cuja monotonia, uniformidade, é de certo surpreen- dente. Vai ser promovida ali a relação de objeto num artigo intitulado Este esquema inscreve, inicialmente, a relação do sujeito com o "Evolução da psicanálise", e, como último termo desta evolução, Outro. Tal como constituída no começo da análise, esta é a relação de verão, no artigo "A clínica psicanalítica", uma apresentação da própria fala virtual, pela qual o sujeito recebe do Outro sua própria mensagem, clínica que a centra, inteiramente, na relação de objeto. Talvez eu lhes sob a forma de uma palavra inconsciente. Esta mensagem lhe é inter- dê alguma ideia de como se pode alcançar uma tal apresentação. ditada, é por ele profundamente desconhecida, deformada, estagnada, O conjunto é absolutamente espantoso. Ali vêem-se praticantes interceptada pela interposição da relação imaginária entre ata', entre da análise tentando ordenar seus espíritos, a compreensão que eles o eu e o outro, que é seu objeto típico. A relação imaginária, que é possam ter de sua própria experiência, em torno da relação de objeto, uma relação essencialmente alienada, interrompe, desacelera, inibe, sem que esta lhes pareça dar uma satisfação plena e integral, mas, por inverte na maioria das vezes, desconhece profundamente a relação de outro lado, não sem que ela oriente sua prática, e a penetre muito palavra entre o sujeito e o Outro, o grande Outro, na medida em que profundamente. Não se pode dizer que o fato de que eles concebam este é um outro sujeito, um sujeito por excelência capaz de enganar. sua experiência nesse registro seja sem consequência sobre os próprios Este esquema, não é em vão que o introduzimos na experiência modos de sua intervenção, sobre a orientação dada à análise e, ao analítica, tendo em vista a maneira como esta última vem sendo mesmo tempo, sobre seus resultados. A teoria analítica e a prática, formulada hoje em dia por um número cada vez maior de analistas, sempre se disse, não podem se dissociar uma da outra e, a partir do 12 TEORIA DA FALTA DE OBJETO INTRODUÇÃO 13 momento em que se concebe a experiência num certo sentido, é ine- objeto para o outro, que há um certo tipo de relações em que a vitável que se a conduza igualmente nesse sentido. Certamente, os reciprocidade, pelo viés de um objeto, é patente, e mesmo constituinte. resultados práticos só podem ser entrevistos. Gostaria de acentuar, de forma mais fundamentada, os três modos Para introduzir a questão da relação de objeto e, precisamente, sob os quais nos aparecem as noções relativas ao objeto em questão. a de saber se é legítimo, se é fundado ou não dar-lhe uma situação Se vocês se remeterem ao capítulo três dos Três ensaios, verão algo central na teoria analítica, vou recordar-lhes, ao menos resumidamen- que já está lá desde a época em que foi redigido o Entwurf, texto sobre te, o que esta noção deve, ou não, ao próprio Freud. Vou fazer isso o qual vou lembrá-los que só foi publicado por uma espécie de acidente em primeiro lugar porque, para nós, é uma espécie de guia, e quase histórico, pois não só Freud não fazia questão de publicá-lo como se uma limitação técnica que nos impusemos aqui, partir do comentário pode até dizer que foi publicado contra a sua vontade. Reportando-nos, freudiano. todavia, a este primeiro esboço de sua psicologia, encontramos ali a Também senti em vocês este ano algumas interrogações, senão mesma fórmula a propósito do objeto. Freud insiste no seguinte: que inquietudes, quanto a saber se eu ia ou não partir dos textos freudianos. toda maneira, para o homem, de encontrar o objeto é, e não passa E, sem dúvida, é muito difícil, a propósito da relação de objeto, partir disso, a continuação de uma tendência onde se trata de um objeto dos próprios textos de Freud, porque ela não está neles. Estou falando, perdido, de um objeto a se reencontrar. naturalmente, daquilo que é muito formalmente afirmado aqui como Não se trata, em absoluto, do objeto considerado na teoria moderna um desvio da teoria analítica. Logo, devo realmente partir de textos como o objeto plenamente satisfatório, o objeto típico, o objeto por recentes e, ao mesmo tempo, de uma crítica de suas posições. Em excelência, o objeto harmonioso, o objeto que funda o homem numa contrapartida, o fato de devermos, em última instância, nos referir às realidade adequada, na realidade que prova a maturidade — o famoso posições freudianas não é duvidoso e, ao mesmo tempo, não podemos objeto genital. É surpreendente ver que, no momento em que faz a deixar de evocar, nem que seja muito rapidamente, aquilo que, nos teoria da evolução instintual tal como esta se origina das primeiras temas fundamentais propriamente freudianos, gira em torno da própria experiências analíticas, Freud nos indica que o objeto é apreendido noção de objeto. pela via de uma busca do objeto perdido. Este objeto, que corresponde Não vamos poder fazer isso, de saída, de uma maneira desenvol- a um estágio avançado da maturação dos instintos, é um objeto re- vida. É precisamente no final que vamos encontrá-la, e que teremos encontrado, o objeto reencontrado do primeiro desmame, o objeto de articulá-la. que foi inicialmente o ponto de ligação das primeiras satisfações da Quero, portanto, simplesmente fazer uma breve recordação, que criança. nem mesmo seria concebível se não houvesse, por trás de nós, nossos É claro que uma discordância é instaurada pelo simples fato dessa três anos de colaboração na análise de textos, e se vocês já não repetição. Uma nostalgia liga o sujeito ao objeto perdido, através da houvessem encontrado comigo, sob formas diversas, o tema do objeto. qual se exerce todo o esforço da busca. Ela marca a redescoberta do signo de uma repetição impossível, já que, precisamente, este não é o mesmo objeto, não poderia sê-lo. A primazia dessa dialética coloca, no centro da relação sujeito-objeto, uma tensão fundamental, que faz com que o que é procurado não seja procurado da mesma forma que Em Freud, fala-se, é claro, de objeto. A última divisão dos Três ensaios o que será encontrado. É através da busca de uma satisfação passada sobre a teoria da sexualidade se chama, precisamente, "A descoberta e ultrapassada que o novo objeto é procurado, e que é encontrado e do objeto", Die Objektfindung. Fala-se implicitamente do objeto, a apreendido noutra parte que não no ponto onde se o procura. Existe cada vez que entra em jogo a noção da realidade. Fala-se dele, ainda, aí uma distância fundamental, introduzida pelo elemento essencial- de uma terceira forma a cada vez que é implicada a ambivalência de mente conflitual incluído em toda busca do objeto. Esta é a primeira certas relações fundamentais, isto é, o fato de que o sujeito se faz de forma sob a qual, em Freud, aparece a relação de objeto. 14 TEORIA DA FALTA DE OBJETO INTRODUÇÃO 15 Para dar plena ênfase ao que estou frisando aqui, seria preciso que um retorno impossível, também a realidade, como mostra a articulação nos resolvêssemos a articulá-lo em termos filosoficamente elaborados. do princípio de realidade e do princípio do prazer, está em oposição Se não o faço, intencionalmente, é porque reservo isso para o momento fundamental em relação ao que é procurado pela tendência. Em outras em que voltarmos a este termo. Mas aqueles para quem esses termos palavras, a satisfação do princípio do prazer, sempre latente, subja- já têm um sentido, devido a certos conhecimentos filosóficos, já podem cente a todo exercício da criação do mundo, tende sempre, mais ou perceber toda a distância que separa a relação freudiana do sujeito ao menos, a se realizar numa forma mais ou menos alucinada. A organi- objeto das concepções precedentes, que são fundadas na noção do zação subjacente ao eu, aquela da tendência do sujeito como tal, tem objeto adequado, o objeto esperado antecipadamente, cooptado à ma- sempre a possibilidade fundamental de se satisfazer numa realização turação do sujeito. A perspectiva platónica funda toda apreensão do irreal, alucinatória. Aí está a outra posição que Freud enfatiza vigo- objeto no reconhecimento, na reminiscência, de um tipo de certo modo rosamente, e isso desde a Traumdeutung, isto é, desde sua primeira pré-formado. Ela está separada, por toda a distância que há entre a formulação plena e articulada da oposição entre o princípio de reali- experiência moderna e a experiência antiga, da noção dada em Kier- dade e o princípio do prazer. kegaard sob o registro da repetição, repetição sempre procurada, mas Essas duas posições não são, como tais, articuladas uma com a nunca satisfeita. Por sua natureza, a repetição se opõe à reminiscência. outra. O fato de que se apresentem em Freud como distintas marca Ela é sempre, como tal, impossível de saciar. É nesse registro que se bem que não é em torno da relação do sujeito ao objeto que se centra situa a noção freudiana da redescoberta do objeto perdido. o desenvolvimento. Se cada um desses dois termos encontra seu lugar Vamos guardar este texto, que mostra bem que Freud situa de saída em pontos diferentes da dialética freudiana, é pela simples razão de a noção do objeto no quadro de uma relação profundamente conflitual que em nenhum caso a relação sujeito-objeto é central. do sujeito com seu mundo. Como poderia ser diferente, se, já desde Se essa relação pode parecer sustentar-se de maneira direta e sem aquela época, é essencialmente da oposição entre princípio de reali- hiância é somente porque se trata das relações chamadas, desde então, dade e princípio de prazer que se trata? de pré-genitais: ver-ser visto, atacar-ser atacado, passivo-ativo. O su- Princípio do prazer e princípio de realidade não são destacáveis jeito vive essas relações de um modo que implica sempre, de maneira um do outro. Diria mais, eles se implicam e se incluem um ao outro, mais ou menos implícita, mais ou menos manifesta, sua identificação numa relação dialética. com o parceiro. Essas relações são vividas numa reciprocidade — o O princípio de realidade só é constituído por aquilo que é imposto termo é válido aqui — de ambivalência entre a posição do sujeito e a para sua satisfação ao princípio do prazer, ele não passa de seu pro- do parceiro. longamento e, inversamente, implica, em sua dinâmica e procura fun- Neste nível, com efeito, introduz-se uma relação entre o sujeito e damental, a tensão fundamental do princípio do prazer. Ainda assim, o objeto que não somente é direta e sem hiância, mas que é, literal- entre os dois, e isso é o essencial da contribuição da teoria freudiana, mente, equivalente de um ao outro. Foi esta relação que pôde fornecer existe uma hiância, que não se poderia distinguir se um fosse simples- o pretexto para que se pusesse em primeiro plano a relação de objeto mente a continuação do outro. O princípio do prazer tende, com efeito, como tal. Essa rejação de reciprocidade entre o sujeito e o objeto, que a se realizar em formações profundamente irrealistas, enquanto o merece ser chamada uma relação em espelho, já formula por si só princípio de realidade implica a existência de uma organização ou de tantas questões que, para tentar resolvê-las, introduzi eu mesmo na uma estruturação diferente e autónoma, condicionando que o que ela teoria analítica a noção do estádio do espelho. apreende pode ser, justamente, fundamentalmente diferente daquilo O que é o estádio do espelho? É o momento em que a criança que é desejado. Esta relação introduz, ela própria, na dialética do reconhece sua própria imagem. Mas o estádio do espelho está bem sujeito e do objeto, um outro termo, formulado aqui como irredutível. longe de apenas conotar um fenómeno que se apresenta no desenvol- Assim como o sujeito, como vimos há pouco, está sempre fadado vimento da criança. Ele ilustra o caráter de conflito da relação dual. nas suas exigências primordiais a um retorno, que é, por isso mesmo, Tudo o que a criança aprende nessa cativação por sua própria imagem 16 TEORIA DA FALTA DE OBJETO INTRODUÇÃO 17 2 é, precisamente, a distância que há de suas tensões internas, aquelas mesmas que são evocadas nessa relação, à identificação com essa Segundo reconhecem aqueles mesmos que estão engajados nessa via, imagem. Aí está, pois, o que serviu de tema, de ponto central, para a o progresso da experiência analítica teria sido a colocação em primeiro colocação em primeiro plano dessa relação sujeito-objeto, da qual se plano das relações do sujeito com o seu meio. faz a escala fenomênica a que se remeter, validamente, o que até então A ênfase posta no ambiente constitui uma redução do que é pro- era apresentado em termos não só pluralistas, mas realmente confli- tuais, como que introduzindo uma relação essencialmente dialética porcionado por toda a experiência analítica. É um retorno à posição entre os diferentes termos. simplesmente objetivante que coloca em primeiro plano a existência Um dos primeiros a ter dado essa ênfase nova, mas não tão cedo de um certo indivíduo em sua relação mais ou menos adequada, mais quanto se acredita, foi Karl Abraham. ou menos adaptada, ao seu meio. Para ilustrar isso para vocês, creio Até ali, a evolução do sujeito era sempre vista por reconstrução, não poder fazer melhor senão remetê-los às formulações encontradas de uma maneira retroativa, a partir de uma experiência central, a da das páginas 761 a 773 da obra coletiva de que falávamos. tensão conflitual entre consciente e inconsciente. Tensão conflitual Depois de nos frisarem que é das relações do sujeito com seu meio criada pelo fato fundamental de que o que é buscado pela tendência que se trata no progresso da psicanálise, aprendemos, incidentalmente, é obscuro, de modo que aquilo que a consciência reconhece dele é, que isso é particularmente significativo na observação do pequeno antes de mais nada, desconhecimento. Não é na via da consciência Hans, onde os pais surgem, como nos dizem, sem personalidade que o sujeito se reconhece, existe outra coisa e um mais-além. Sendo própria. Não somos forçados a subscrever essa opinião. O importante este mais-além fundamentalmente desconhecido pelo sujeito, fora do é o seguinte: Era antes da guerra de 1914, na época em que a alcance de seu conhecimento, ele coloca, ao mesmo tempo, a questão sociedade ocidental, segura de si, não formulava questões sobre a sua de sua estrutura, de sua origem e de seu sentido. própria perenidade; ao contrário, a partir de 1926, a ênfase foi dada Ora, essa perspectiva foi abandonada, por iniciativa de um certo à angústia, e à interação entre o organismo e o meio ambiente; foi número de personalidades, acompanhadas por correntes significativas assim que os alicerces da sociedade foram abalados, a angústia do no interior da análise. Tudo foi recentrado em função de um objeto e, mundo em transformação é vivida a cada dia, os indivíduos se reco- mais precisamente, de seu estado terminal. Enquanto isso nós retro- nhecem diferentes. É a época em que a física se procura; relativismo, cedemos para compreender como é atingido o ponto terminal, que incertezas, probabilismo parecem tirar ao pensamento objetivo sua aliás nunca é observado, pois o objeto ideal é literalmente impensável confiança em si mesmo. — na nova perspectiva, este objeto ideal é, ao contrário, concebido Esta referência à física moderna como fundamento para um novo como um ponto de mira, um ponto de chegada para o qual concorre racionalismo me parece dever dispensar comentários. O importante é toda uma série de experiências, de elementos, de noções parciais do aquilo que curiosamente é confessado de maneira indireta: que a objeto. Essa perspectiva se impôs, progressivamente, a partir do mo- psicanálise seria uma espécie de remédio social. Eis o que se coloca mento em que Abraham a formulou em 1924 na sua teoria do desen- em primeiro plano, e que se apresenta como característica do elemento volvimento da libido. Sua concepção funda, em muito, a própria lei motor de seu progresso. Pouco importa se isso é fundamentado ou da análise, enquadra tudo aquilo que aí se passa, desenha o sistema não, pois estas são, para dizer a verdade, coisas que nos parecem de de coordenadas no interior das quais se situa toda a experiência ana- pouco peso — o que é instrutivo é a enorme leviandade com que tais lítica, e determina seu ponto de encerramento, este famoso objeto coisas são admitidas. ideal, terminal, perfeito, adequado, que é apresentado como marcando Este exemplo não é único, pois o próprio dessa obra é ser coletiva por si mesmo o alvo atingido, a saber, a normalização do sujeito. em seu interior mesmo, de tal modo ela parece ser feita de uma curiosa O termo normalização já introduz, por si só, um mundo de cate- homogeneização, mais que de uma articulação, propriamente falando. gorias bem estranho ao ponto de partida da análise.

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