-·--··-.. - . . .. , . : .. . ' .. .. ' ·': ,, ·~ ' •• , SUMARIO ' • ,. AGRADECIMENTOS 8 ' ; ~- INTRODUÇÃO 12 ' ! Contexto 12 Uma breve visão geral do gênero do horror 16 · Uma filosofia do horror? 20 1. A NATUREZA DO HORROR 26 A definição de horror 26 Biologias fantásticas e as estruturas das imagens de horror 63 Resumo e conclusão 75 2. METAFÍSICA E HORROR OU O RELACIONAMENTO COM AS FICÇÕES 92 O medo de ficções: Sobre o paradoxo aqui referido e sua s9lução 94 Identificação com o peraÕnàgàm? 129 3. ENREDOS DE HORROR 146 Enredos de horror 146 Alguns enredqs de horror característicos 147 " Horror e suspense 185 O fantástico 205 4. POR QUE O HORROR? 230 Por que o horror? 230 O paradoxo do horror 233 Horror e ideologia 276 O horror hoje 288 ÍNDICE · J 11 • '11 .. . ' ' • . ;.-... , S em dúvida, meus ·pais, Hughie e Evelyn Carroll, deram origem sem querer a este tratado quando me d isseram para não perder tempo e dinheiro com livros, revistas, revistas em quadrinhos, programas de TV e filmes de horror. Num ato final de provocação filial, eu, um homem de meia idade nascido no pós-gueiTa, decidi provar a .eles que aquele tempo todo me dedicara a algo proveitoso. Minha reflexão sobre o horror começou realmente a se a1ticular quando Annette Michelson e eu demos um curso sobre horror e ficção científica na Universidade de Nova York. Annette ministrava a metade do curso que se referia à ficção científica, ao passo que as partes mais pegajosas do terreno ficavam para mim. Annette foi, e continua sendo, muito útil no desenvolvimento de minha teori~. Sugeriu que organi zasse minhas noções sobre biologias do horror em termos de fusão e fissão, e também me instou continuamente, diante~ de meu ceticismo em relação à atual teoria do cinema, a levar a sério o pat:"adoxo da ficção. Embora minhas soluções a suas questões possam não ser o que ela aguardava, espero que sejam pelo menos intrigantes. Anteriormente, dois filósofos - ambos viciados em horror - fortaleceram-me na convicção de que tratar desse assunto poderia ser interessante. Judith Tormey e eu 8 ·---· ·----·---· ··- ---- ·- ·- -- -·-- - -· - - -· -- -- ~ ·.· .... -···-- ...... ...· .·- ... ····- . .. -- - -···. ... ·--·--- ...~ ' .... ·. ' ' 1 '· ., f ., l" ~. AGRADECIMENTOS ~ : . . : .,}. ' •I ' ,. fizemos juntos uma divertida viagem ao México, todos os demais abo~recendo passageiros do carro com nossas histórias de monstros preferidas. JeffBlustein leu meus primeiros ensaios na teoria do horror com o rigor analítico e colTl o entusiasmo que só . ' um fã de horror pode ter. O falecido Monroe Beardsley também leu meus esforços nascentes no campo da teoria do horror. Disse não entender como eu podia me interessar por esse tipo de coisa. . .·.•.·. . Mas, depois, discutiu minhas hipóteses apres~ntando contra-exemplos que só podem ser entendidos como esotéricos. Timidamente, explicou seu respeitável conhecimento na . fi matéria dizendo que tivera de acompanhar os filhos pelo ciclo de fllmes de horror dos ~· anos 50, e que se lembrava de alguns dos filmes (em detalhes impressionantes, eu diria). t ... . .. . Meu interesse pelo horror foi aos poucos se convertendo em artigos acadêmicos, . apresentados na Universidade do Sul da Califórnia, na Universidade de Warwick, no Museu da Imagem em Movimento, no LeMoyne College, na Universidade C01·nell, ~e na Universidade de Nova Yo rk e na Universidade de Iowa. Cada auditório fez . , comentários estimulantes - menção especial merecem os de: Stanley Cavell, Ed Leites, . ' Karen Hansen, Richard Koszarski, Johnny Buchsbaum, Stuart Liebman, Allan Casebier, 9 Jim Manley, Bruce Wilshire, Susan Bordo, o falecido Irving Thalberg jr., Stephen Melville, Mary Wiseman, Ken Olsen, Nick Sturgeon, Anthony Appiah, David Bathrick, Cynthia Baughman, Murray Smith, Dudley Andrew, Henry Jenkins, Kristin Thompson, ·Berenice Reynaud e Julian Hochberg. Boa parte da redação inicial deste livro teve início durante um ano sabático na Universidade Wesleyana. Discussões iniciais com Kent Bendall- um dos filósofos mais precisos e, no entanto, de imaginação mais aberta que tive o privilégio de conhecer deram-me importantes idéias para resolver o que chamo de paradoxo da ficção. Longas conversas com Chris Gauker, durante vários jantares extremamente agradáveis, ajuda ram-me a esclarecer minha posição. Ken Taylor e, sobretudo, Philip Hallie, cujo trabalho pioneiro na filosofia do horror, em seu livro The paradox crnelty, serviu-me de modelo, ouviram as minhas teorias com uma atenção crítica generosa e sempre . ' encorajadora e iftstrutiva. Phil queria até ir comigo a vários filmes e depois discuti-los (um gesto de companhe!rismo irrestrito é algo que só quem trabalha com o gênero do horror pode perceber). . Michael Denning, Nancy Armstrong e Leonard Tennenhouse deram muitas suges tões proveitosas acerca de correspondências entre a minha pesquisa e os estudos literários contemporâneos. Betsy Traube, transcendendo sua aversão por meu assunto, fez várias recomendações pertinentes sobre a literatura antropológica a esse respeito. Khachig Tololyan, que, entre suas muitas realizações, dirige um dos maiores serviços de recortes de jotnal do mundo, manteve-me sempre em dia quanto ao tema. E Jay Wallace, que leu os rascunhos dos dois primeiros capítulos com enorme atenção, brindou-me com muitas críticas e sugestões. Em mais de uma oportunidade, Jay mostrou como eu poderia modificar judiciosamente minhas afirmações sem abandonar minhas posições. Tanto seu interesse genuíno quanto seus argumentos tiveram muita influência sobre este livro. Foi maravilhoso ter sido seu colega. Francis Dauer, Annette Bames, John Fisher, Dale Jamieson, George Wilson, Arthur Danto, George ·Dickie, John Morreall, Richard Moran, Teny Irwin, Laurent Stern, Paul Guyer, Alex Sesonske, Daniel Banes, Jennefer Robinson, Susan Feagin, Gary Iseminger, Roy Gordon e Myles Brand ouviram ou leram minhas hipóteses e fizeram comentários que achei importante levar em consideração. Joe Margolis, em várias conversas, mostrou-me a necessidade de fazer diversas distinções que eu ignorara, bem como indicou alguns autores cuja obra eu desconhecia. Richard Shusterman, depois de ler meu ensaio "A natureza do horror", alettou-me para a existência dos escritos seminais 10 ... .•. . : •. e mais avançados de Peter Lemarque acerca do mesmo tipo de teoria de objetos ficcionais ql.le eu estava tentando desenvolver. Tony Pipolo e Amy Taubin, tendo ambos visto e lido tudo, deram-me informações de "primeira mão" sobre cada romance, cada filme e cada yfdeo que eu esperava acomodar em minha teoria. Se a sensibilidade deles superou minhas fónnulas, espero, no entanto, que possam ver que algumas de suas intuiçOes influíram em minhas · descrições. David Bordwell, David Konstan e Peter Kivy leram o manuscrito inteiro. Cada um deles fez críticas estimulantes e sugestões úteis. David Bordwell mostrou-me que eu precisava tornar mais clara a distinç.ão entre a minha teoria e os modelos psicanalíticos hoje dominantes nas ciências humanas, bem como corrigir alguns (não eram tantos assim) de meus erros acerca da história do cinema. David Konsmn fez observações sentença por sentença, muitas das quais incorporei; suspeito que aquelas que deixei de lado ficaram por minha conta e risco. Peter Kivy fez não apenas a revisão do manuscrito como também muitos comentários filosóficos penetrantes sobre seu contelldo. No entanto, acima de tudo, é a Peter que devo, graças a seu trabalho na filosofia da música, a intuição da aplicabilidade, em geral, da teoria das emoções a questOes da filosofia da arte . • Devo um agradecimento especial a William que podemos dizer ter sido Genn~tnOr o primeiro a pensar que este livro podia ser escrito. Durante uma conversa sobre outros assuntos, ele indicou que "adoraria" (foi a palavra) uma minha de um livro prop~s~ . . .... ~ sobre a filosofia do horror. Se não fosse isso, eu não teria pensado no assunto. O resto é história (destino?). Dediquei este livro a minha mulher, Sally Banes. Ela me acompanhou corajosamente em minhas muitas incursões a cinemas e teatros em todo o mundo no interesse da minha "pesquisa". Aguardou paCientemente enquanto eu examinava inúmeros mostruários de livros toda vez que ia a uma mercearia, a uma fanná.cia ou a uma loja de departamentos. Seu próprio trabalho sobre contos de fadas também me forneceu um complemento extremamente útil à teorização sobre o horror. Sally leu todos os rascunhos deste projeto e fez um comentário constante: gramatical .e lógico; estiHstico e conceituai. Se tal livro é um trabalho de amor, é também um trabalho de amantes. E tive a sorte de ter uma amante que quis adotar o meu projeto. Muita gente inteligente e talentosa me disse muita coisa. Se ainda houver imperfeições neste texto, é prova apenas de que sou mau ouvinte. 11 .,. . ' Contexto Durante mais de uma década e meia, talvez sobretudo nos Estados Unidos, o horror floresceu como fonte importante de estímulo estético de massa. De fato, ele pode até ser o gênero de vida mais longa, o mais amplamente disseminado e o mais persistente da era pós-Vietilã. Os romances de horror parecem estar disponíveis virtualmente erh todo supermercado e toda farmãcia, e novos títulos surgem com desconcertante rapidez. O assalto dos romances e das antologias de horror, pelo menos atualmente, é tão irreprimível e inevitável quanto os monstros que eles retratam. Um autor do gênero, Stephen King, tomou-se um nome familiar, ao passo que outros, como Peter Straub e Clive Barker, embora menos conhecidos, também têm muitos admiradores. Os cinemas populares também ficaram tão obcecados com o horror desde o sucesso de bilheteria de O exorcista que é difícil visitar um cinema local de várias salas sem se deparar com pelo meno~ .um monstro. A evidência da imensa produção de filmes de horror na última década e meia também é facilmente confirmada por um 12 INTRODUÇÃO cálculo rápido da área reservada aos filmes de horror na locadora de vídeo da vizinhança. O horror e a música unem forças explicitamente nos vídeos -de rock, especialmente em Tbril/er, de Mic~ael Jackson, embora possamos também lembrar que a iconografia de horror dá uma coloração geral a grande parte da M1V e da indústria de música pop. O grande sucesso musical da Broadway em 1988 foi, evidentemente, O fantasma da ópera, que já havia feit~ sucesso em Londres e inspirou companheiros de viagem improváveis como Carrie, a estranha. Na parte dramática do teatro, apareceram novas versões de clássicos do horror, como as variações de Drácula de Edward Gorey, e a 1V lançava várias séries de horror ou relacionadas com o horror, como A hora do pesadelo. O horror aparece até mesmo nas belas-artes, não apenas diretamente, nos trabalhos de Francis Bacon, H.R. Giger e Sibylle Ruppert, mas também sob a forma de alusões nos pastiches de muitos artistas pós-modernos. Em suma, o horror tornou-se um artigo básico em meio às formas artísticas contemporâneas, populares ou não, gerando em quantidade vampiros, duendes, diabretes, zumbis, lobisomens, crianças possuídas pelo demónio, monstros espaciais de todos os tamanhos, fantasmas e outros 13 preparados, num ritmo que fez os últimos dez anos, mais ou menos, parecerem uma longa noite de dia das bruxas. Em 1982, Stephen King especulou-como muitos de nós no fmal de cada verão - que o atual ciclo de horror parecia estar chegando ao fim. 1 Mas, no momento em que esta introdução está sendo escrita, Freddy - em sua quarta reencarnação lucrativa - ainda está aterrorizando os herdeiros de Elm Street, e uma nova coleção de autoria de Clive Barker, intitulada Cabal, acaba de chegar pelo correio. Em princípio, o atual ciclo de horror ganhou impulso lentamente. Do lado Hterário, foi anunciado pelo aparecimento de O bebê de Rosemary (1967), de Ira Levin, e de Balada para satã (1969), de Fred Mustard Stewart, que abriram caminho para sucessos de venda CO!ll? A inocente face do terror 0971), de Tom Tryon e o campeão de bilheteria O exo~c~ta (também de 1971), de William Peter Blatty.2 O múcado leitor de massa conseguido sobx;etudo por O exorcista foi, em seguida, consolidado pela publicação de livros como: 7be Stepford wtves (1972), de Ira Levin; o primeiro romance publicado de Stephen King, Carrie (1973); Burnt offerings (1973), de Robert Marasco; The sentinel (1974), de Jeffrey Konvitz; e Safem :s-lot 0975), de King. Evidentememe, a literatura de horror - criada por mestres como Richard Matheson, Dennis Wheatley, John Wyndham e Robert Bloch - sempre esteve disponível antes da publicação desses livros. Mas o que parece ter ocorrido na primeira metade da década de 1970 é que o horror, por assim dizer, adentrou a corrente principal. Seu público deixou de ser especializado, ampliou-se, e os romances de horror foram se tornando de acesso cada vez mais fácil. Isso, por sua vez, aumentou o púbHco que estava em busca de entretenimento de horror e, no fmal da década de 1970 e no começo da de 1980, surgiu um grande número de autores para satisfazer essa demanda, entre eles: Charles L. Grant, Dennis Etchinson, Ramsey Campbell, Alan Ryan, Whitely Strieber, James Herbert, T.E.D. Klein, John Coyne, Anne Rice, Michael McDowell, Dean Koontz, John Saul e muitos outros. Sem dúvida, como o leitor reconhecerá imediatamente, os romances mencionados anteriormente foram todos transformados em filmes, não raro em filmes de muito sucesso. Nesse aspecto, o mais impoltante, quase não é preciso dizer, f()i O exorcista, dirigido por William Friedkin e lançado em 1973. Considera-se que o sucesso desse filme não só agiu como um estimulante para a produção de filmes, como também tornou o horror mais atraente aos editores, pois muita gente que se aterrorizou com o filme comprou o romance e adquiriu gosto pela literatura de horror. A relação entre 14 filme de horror e literatura de horror é muito íntima no atual ciclo de horror-tanto no sentido óbvio de que não raro os filmes de horror são adaptados de romances de horror quanto no sentido de que muitos dos escritores do gênero foram muito influenciados pelos ciclos anteriores de filmes de horror - aos quais se referem não apenas em entrevistas, mas também no texto dos romances.3 Evidentemente, a influência imensa exercida sobre a indústria do cinema pelo sucesso de O exorcista é até mais evidente do que seu impacto sobre o mercado literário. Estabelecendo os temas recorrentes de possessão e de teleclnese, O exorcista (o filme) foi imediatamente seguido por uma grande quantidade de imitadores, como Abby, Espírito malígno, La endemoniada (também conhecido como Demon wttch cbild), Exorcismo e 1be devil's raín. Inicialmente, parecia que o gênero iria se perder numa enxurrada de imitações medíocres. Mas, em 1975, Tubarão sacudiu o mercado de filmes, dando de novo aos produtores de cinema a certeza de que ainda havia ouro a ser garimpado no campo do horror. Quando a reação a Tubarão (e seus derivados) , parecia diminuir, vieram juntos Carrie, a estranha e A profecia. E, em seguida, em 1977, Guerra nas estrelas, embora não sendo um ftlme de horror, abriu as portas ao espaço sideral, admitindo, por fim, Alien, o oitavo passageiro e que tais. Toda vez que a saúde do gênero parecia ameaçada, ele subitamente se restabelecia. Parece imensamente resistente. Isso indica que atualmente os gêneros fantásticos, dos quais o horror é um exemplo eminente, entram sempre em consideração quando os prod]..ltores pensam no que fazer em seguida. O resultado disso foi um m~unero realmente impressionante de títulos de horror. Também temos agora uma geração de diretores consagr&dos, muitos dos quais são reconhecidamente especialistas em filmes fantásticos/de horror, entre os quais: Steven Spielberg, David Cronenberg, Brian De Palma, David Lynch, John Carpenter, Wes Craven, Philip Kaufman, Tobe Hooper, John McTieman, Ridley Scott e outros. I Ao enfatizar o grande número de ftlmes de horror produzidos na última década e meia, não quero dizer que não houvesse ftlmes de horror na década de 1960. No entanto, tais filmes eram um tanto marginais; tinha-se de ficar de olho nas últimas ofertas da American International Pictures, de William Castle e da Hammer Films. Roger Corman, embora adorado pelos conhecedores do horror, não era uma figura de muita fama; e clássicos da madrugada, como A noíte.dos mortos-vivos, de George Romero, tiveram sobretudo uma reputação marginal. A série de sucessos de bilheteria, come- 15