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Os sonhadores de Vila Rica - A Inconfidência Mineira de 1789 PDF

71 Pages·1989·22.74 MB·Portuguese
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A Inconfidéncia M ineira de 1789 Edgard Luiz de Barros 42 EDICAO " F HT N r r r) AE EA R E E O EE N al ' E N OE R y Ms” Gars.d N ii is T F - j N ' ET N gan i EE ed i eg UR TE A E om , t d w o OP R A d a pe d r w E E e d m A K N N A E k O k ea e d E S H R E E Te mde FR Faf E E N a VEE V Par ed * or DE] OE * N N E E F PU PT] E N E n d a r F PARIE Panorama da Inconfid AN ENCI1aA Para due a padinacao ficasse correta, indice e demais informacêes foram colocadas ao final do ardguivo. O indice esta na pagina 68 o decorrer da histéria do dominio portuguës so- bre o Brasil foram muitos os motins, conspira- cêes, revoltas e rebeliëes em praticamente todos os pontos do territêrio colonial. Mas o primeiro movimento a realmente manifestar com dlareza suas intencoes de rom- per com os lacos do colonialismo ocorreu em Vila Rica, na capitania das Minas Gerais, entre 1788 e 1/89. Ao con- trêrio de movimentos anteriores, gue muitas vezes nao pas- saram de reivindicacêes mais restritas, a chamada Inconfidência* Mineira pretendia, sobretudo, a indepen- dência do Brasil em relacao a Portugal. e É importante esclarecer gue o termo “'inconfidência””, o usado pelo dominador, significa guebra de fidelidade, trai- Gao a confianca da Coroa portuguesa. Era, portanto, uma pecha”* infamante agueles gue ousaram nao se submeter aos rigores do sistema colonial. Neste livro, porém, o uso da palavra ``inconfidência'” adguire valor positivo, real- cando a consciëncia de ruptura pretendida pelos partici- pantes do movimento, gue se negavam a viver sob a re- pressao portuguesa. sk Ouro e revolta O século XVIII marcou na Colênia o intenso desen- volvimento da economia mineradora. Na conguista do vas- to territêrio, cuja posse Portugal legitimou por meio de nu- merosos tratados, os bandeirantes desempenharam papel de extrema importência, rompendo as barreiras do sertao !k As palavras com asteri# sco saedo defini- das no Vocabuldrio" , no final do 1Vro. a procura de indios e de ouro. Da famosa bandeira de Fer- nao Dias Paes, organizada em 1674, até o comeco do sé- culo X VIII, os paulistas definiram os contornos da regido das Minas Gerais, gue viveria uma verdadeira ''febre do ouro''. Seu esplendor foi, contudo, de breve duracao. Na verdade, menos de cem anos transcorreram entre a desco- berta das primeiras jazidas e a decadência dos fles aurileros”; pouco tempo para o término de um sonho gue envolveu milhares de pessoas e favoreceu a primeira ex- plosao urbana da vida brasileira. Incentivando a fundac3o de cidades nas Minas Ge- rais, Portugal procurava facilitar a cobranca de 1IMPpOStOS. Em curto prazo, porém, as vilas criadas voltaram-se con- tra o fisco”, a predatêria cobranca de impostos. Um mo- do de ser brasileiro, com caracteristicas prêprias, comecava a €xprimir-se, nao sê nos protestos, mas também na obra de numerosos artistas gue o ouro atraiu: muisicos, poetas, pintores, arguitetos, escultores, entalhadores. Trabalhan- do em geral como simples oper4rios, esses homens fizeram brilhar o estilo Barroco na terra mineira. O ouro luzia nas igrejas de Minas Gerais, nas casas dos funciondrios da Co- roa e, principalmente, nos suntuosos edificios e palêcios monumentais de Portugal. Os diamantes possibilitaram a Cr1iacao de fantasticas fortunas e confinaram em estreitos limites territoriais a populacao amedrontada do distrito on- de eram explorados. Em suma, as riguezas gue geravam cidades, opulência* e arte faziam surgir também a inten- sa Opressao, e desta nascia a revolta. A partir da metade do século X VIII, a regiao de Mi- nas (zerais, a mais rica do Brasil, passou a sentir cada vez mais duramente as restricoes e a violência da situacao co- lonial. Durante muitas décadas o ouro brasileiro havia che- gado em grandes guantidades aos cofres portugueses, mas agora esse fluxo comecava a diminuir. O “*guinto””, a ve- ha taxaGao gue obrigava os mineradores a entregar 1/5 de todo o metal extraido a Portugal, j& nao bastava para satisfazer as necessidades da Coroa, e os portugueses gue- riam mais. Ao mesmo tempo, uma série de restricêes eco- Ë " f ad nêmicas, como o Alvard* de 1785, de D. Maria 1, a Lou- ca, paralisava a vida da Colênia, obrigando-a a vlver sem indistrias e a importar tudo gue consumia. O dominio co- lonial português estrangulava o dia-a-dia dos brasileiros. No plano internacional mudangas importantes esta- vam ocorrendo, novas idéias aplicadas na prêtica demons- travam gue era possivel a libertacao da dominacao colo- nial, e nas colênias da América muita gente sonhava em extirpar de sua terra a violência, a opressao, a injustica. E foi nesse contexto gue um grupo de brasieiros, guase todos muito ricos e membros da elite de Minas Gerais, pla- nejou um movimento capaz de transformar sua reg1iao na primeira reptiblica independente da América do Sul. Tiradentes e a Inconfidenca Entre os conspiradores havia também um personagem diferente, pobre, sem recursos materiais, praticamente au- todidata, um simples alferes* da Cavalaria (suboficial) cha- mado Joaguim José da Silva Xavier, conhecido por todos como 'Tiradentes. Mas foi exatamente ele o grande agita- dor da revolucdo na conturbada Minas Gerais do final do século X VIII. Um decidido e corajoso propagandista — numa época em gue os meios de comunicacio eram pre- cariissimos — de Minas independente, republicana e auto- suficiente. Lutando para desencadear a revolta, Tiraden- tes apresentou-se como um ''revolucion4rio radical”, ca- paz de correr gualguer risco para enfrentar o sistema re- pressivo no gual vivia. Nao tinha nenhum poder, visto gue sua rigueza era inexistente, nao foi um grande poeta, ou grande tebrico, nem conhecia profundamente as obras dlds- sicas de sua época, mas era possivelmente o Ginico, dentre todos os conspiradores da Inconfidência Mineira, gue pos- suia as gualidades de grande agitador, as condicëes para ser um lider popular expressivo, capaz de levantar o povo e leva-lo a insurreic&o*. No dia-a-dia, 'Tiradentes provou possuir certa cons- cléncia politica da opressio da Metré6pole portuguesa so- Pe, N n ”) * bre a Colênia e capacidade de expressar na aG&o uma prê- tica revoluclonaêria. Nao fo1 por acaso gue, com o fracasso do movimento, ele tenha sofrido o pior castigo, o enforca- mento e o esaguartejamento. Alguns historiadores jê disseram gue a tarefa de se escrever uma histêria definitiva da Inconfidência Mineira é 1mpossivel. O tema a estudar é constituido de reunioes secretas, relatorios confidenciais provavelmente destruidos na mesma época, de encontros furtivos, imterrogatOrios, traicoes e assassinatos. A principal fonte documental dis- ponivel, o material bêsico para a analise do assunto, é o volumoso processo registrado como Autos de Devassa da In- confidéncia Mineira. O prêprio processo, entretanto, é pro- blematico, pois, além de ser escrito na linguagem juridica tipica da época, fo1 trabalhado de modo a representar ape- nas parte dos acontecimentos, omitindo muitos fatos e dis- torcendo outros. De gualguer forma, ele é o mnstrumento central de trabalho do historiador para a compreensao da Inconfidência, e é a partir dos muitos depoimentos nele contidos gue se podem visualizar os principais componen- tes do movimento. Duzentos anos apês o fracasso da conspiracao, é pos- sfvel estabelecer uma visdo geral sobre o gue fo1 e como se desenvolveu a Inconfidência Mineira. Nos Gltimos me- ses de 1788, nas reuniëes nas casas da elite de Vila Rica, discutia-se o governo do visconde de Barbacena, gue ha- via comecado em julho. Os homens mais ricos das Minas sabiam gue perderiam suas fortunas guando o governa- dor deflagrasse as medidas para a cobranca forcada dos atrasados para a Fazenda Real (um déficit de 5760 kg de ouro — 384 arrobas*). O fantasma dessa cobranca tor- cada, a chamada ''derrama?”, aterrorizava até mesmo a populac&o mais pobre, pois o imposto incidia sobre todos. Em 1769 houve a primeira cobranca, gue conseguiu a du- ras penas arrancar para a Coroa a cota fixa de 19200 gui- Jos de ouro. Uma segunda derrama se seguiu, em 1768, e durou três anos. Agora, em 1/88, a tensao era insupor- tAvel e nao seria dificil perceber gue a capitania se aproxi- 6 Et mava de um ponto critico, pronta para mais um levante. S6 gue desta vez nio seria uma simples revolta localizada, mas um amplo movimento, bem articulado e com alguma definicao ideolêgica. A articulacio do movimento Os contatos e preparativos jê estavam acontecendo ha vêrios meses e alguns participantes, principalmente Tira- dentes, vinham desenvolvendo intensa campanha para con- seguir mais adeptos e simpatizantes. Mas foi no final de dezembro de 1788, na casa do tenente-coronel Francisco de Paula Freire de Andrade, comandante da 6* Compa- nhia de Drag6es* da capitania de Minas Gerais, gue ocor- reu a mais significativa reuniëo dos inconfidentes” até en- tao. O influente militar, comandante de um dos agrupa- mentos mais famosos da Colênia, recebeu naguela noite cinco conspiradores: o empresêrio de mineracao e mtelec- tual Indcio José de Alvarenga Peixoto; José Alvares Ma- ciel, flho do capitao-mor de Vila Rica e cunhado do dono da casa; o padre José da Silva de Oliveira Rolim, flho do primeiro caixa do Distrito Diamantino; o alferes Joaguim José da Silva Xavier e Carlos Correia de Toledo, vigario de Sao José. Os seis reuniam-se para organizar os planos de um levante armado contra a Coroa portuguesa. Eram todos nascidos no Brasil, representavam diferentes zonas da capitania (Oliveira Rolim era de Serro Frio, Carlos Cor- reia, de Rio das Mortes e Alvarenga Peixoto, da regiao fronteirica com Sao Paulo), e todos eram agentes ativos da revolucao em andamento. Concretamente, todos os presentes tinham também sér1ios motivos imediatos para insurgir-se contra a Metré- pole. Alvares Maciel estava para perder o patrimênio de sua familia. Tiradentes remoia a frustracao de nao ter si- do nunca promovido. Freire de Andrade temia ser afeta- do pela reestruturaG&o da tropa anunciada pelo visconde de Barbacena. Alvarenga Peixoto via na revolta uma for- ma de livrar-se das dividas gue contraira para aperfeicoar MEN ) 7 SN ) suas lavras de ouro. O) padre Rolim estava furioso com as autoridades gue o perseguiam e€ impediam de continuar seu lucrativo trafico de diamantes e escravos. E o padre Toledo temia o resultado do processo gue o aguardava em Lisboa, a propésito de uma guestio em ague se envolvera. A partir desse encontro, foi amplamente debatida e definida a possivel estratégia para o movimento rebelde. Para a guestao fundamental de como mobilizar a popula- cao, todos concordavam due o momento certo seria a im- posicao da derrama, esperada para fevereiro de 1789. Se- ria al, na ocasiao da decretagao da cobranca de impostos atrasados, gue se precipitariam as condicoes para a defla- gracao imediata do movimento e a condguista do apoio po- pular. Uma vez definida a data da derrama, e consegtien- temente da revolucao, todos os conspiradores serlam aler- tados pela senha ``hoje é o dia do batizado””. O movimen- to comecaria com uma agitacdo em Vila Rica, provocada pelo alferes Joaaguim José. Peguenos grupos, com armas escondidas debaixo dos casacos, ampliariam o tumulto. Ouando fossem convocados os drag6es para impor a or- dem, o tenente-coronel Freire de Andrade retardaria a che- gada dos soldados, dando tempo a Tiradentes de partir para Cachoeira, onde residia o governador Barbacena, em uma casa de campo. Tomando de assalto o refigio do governa- dor, 'Tiradentes o executaria, voltando em seguida para Vila Rica. Alimhando suas tropas, Freire de Andrade per- guntaria A multidao o gue pretendia com o tumulto. E Ti- radentes, mostrando a cabeca de Barbacena, bradaria gue gueriam a liberdade. Com a cidade controlada pelos re- voltosos e defendida por Freire de Andrade, seria, entao, proclamada a Reptiblica e lida a declaragëo de Indepen- dência. As vilas vizinhas estariam prontas para dar o apoio necessêrio, seria instalada uma fabrica de polvora, mon- tada por José Alvares Maciel, e o antigo duinto real servi- ria para pagar as tropas e os gastos da campanha, jé pre- vista para três anos de luta armada. Na realidade, muito mais gente passou a fregtientar a casa de Freire de Andrade, envolvida no projeto de in- dependência. E possivel tambêm gue vêrios outros encon- 8 tros tivessem ocorrido naguela época em diferentes locais, ampliando muito o circulo de adeptos da Inconfidéncia. Alguns assumiriam a funcio de ativistas, como todos os par- ticipantes da primeira reuniëo. Outros seriam os ideologos” do movimento, isto é, os gue forneceriam as idélas para a revolucëio — juristas como o desembargador Tomas An- tênio Gonzaga e o veterano advogado de Vila Rica Clau- dio Manuel da Costa, ambos intelectuais famosos, gue su- postamente estiveram elaborando um conjunto de leis pa- ra a futura nacao independente. Houve também figuras gue aderiram ao movimento levadas por interesses puramente “'fisiolêgicos' , razoes ex- clusivamente pessoais — homens muito ricos, como Do- mingos de Abreu Vieira, Joaguim Silvério dos Reis e Joao Rodrigues de Macedo, mas atolados em dividas para com a Fazenda Real e ameagados de perderem seus patrimO- nios com a cobranca da derrama. No passado, durante mui- to tempo, tinham sido eles préprios os opressores, os arre- cadadores e agentes da autoridade real. Agora, ameaca- dos por uma cobranGa enorme e generalizada, uma rebe- liao seria fundamental para Ihes resolver essa delicada si- tuacaoe, ao mesmo tempo, Ihes proporcionar uma facha- da respeitêvel, com o povo ao seu lado. Exatamente deste grupo partiria a dentincia da conspiracao. — gWE RE m Traxao e€ rebressao Os dias foram passando e Barbacena nao imps a der- rama em fevereiro, como se esperava. A tensao continua- va no ar, a populacao pressentia gue algo iria mudar em suas vidas, e o governador procurava ganhar tempo, pre- vendo o potencial explosivo gue a cobranca forcada deto- naria. Os planos dos mconfidentes ficaram suspensos, meio desarticulados pela espera da derrama sem data definida. Gansado de esperar pelo “'batizado'”', 'Tiradentes partiu para o Rio de Janeiro, sob o pretexto de tratar de as- suntos particulares. Na verdade, o alferes desejava tam- bém sondar uma vez mais o estado de espirito nas outras BIBLICTESA PUSLICA MUNICIPAL P. AL SDO M ARCON 9 EARLOR BARBOSA . RS capitanias, principalmente no Rio, com relacao ao levan- te. Estreitaria o contato com seus colegas de farda da guar- nicao carioca, obteria informagdes sobre a possibilidade de conseguir mais armas e, possivelmente, poderia conguis- tar, no caminho de Minas, novos adeptos para a conjuracao”. Em Vila Rica a situacao comecou a desmoronar. Os conjurados passaram a desconfiar do governador, assustando-se com a possibilidade de ele estar sabendo de alguma coisa. Finalmente, calculando gue poderia trocar a cabeca dos companheiros pelo perdao das dividas, Joa- guim Sulvério dos Reis, no dia 12 de marco, correu ao pa- lêclo e, em audiéncia privada, relatou a Barbacena todas as intormacoes sobre o movimento, nao poupando os por- menores e delatando, um por um, todos os conspiradores. Além disso, o traidor iez uma minuciosa dedlaracao por escrito. Uma semana depois da dentincia, Barbacena or- denou oficialmente a suspensao da derrama, acabando com o motivo para o levante gue os conspiradores aguardavam. O paênico fo1 geral. Tiradentes fo1 preso no Rio de Janeiro na noite de 10 de maio de 1789. Em Minas, através de atos bem planeja- dos, o governador conduziu a cacada aos rebeldes, pren- dendo praticamente todos sem disparar um sê tiro de mosaguete”. Tomas Antênio Gonzaga fo1 preso em sua ca- sa no dia 21 de maio e, sucessivamente, foram detidos Do- mingos de Abreu Vieira, o padre Carlos Correia de 'Tole- do, Alvarenga Peixoto e€ muitos outros. Rapidamente, o sonho dos revolucion4rios iria se transformar numa ago- nia mortal. Feitas as prisoes necessêrias, Barbacena comecou a despachar os presos para os cêrceres” do Rio de Janeiro. Por ordem do vice-rei, D. Luis de Vasconcelos, jê havia sido aberta uma devassa (um processo judicial) na capital da Colênia. Logo em seguida, por determinacio de Bar- bacena, outra devassa foi imiciada em Minas. Isso seria um martirio a mais para os prisloneiros, pois entre esses dois processos houve conflitos de jurisdic&o, com funciondrios torcendo os fatos e competindo entre si. O resultado de tal 10

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