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as faces da gula no inferno da divina comédia PDF

48 Pages·2008·0.17 MB·Portuguese
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EMANUEL FRANÇA DE BRITO AS FACES DA GULA NO INFERNO DA DIVINA COMÉDIA Monografia apresentada à disciplina Orientação Monográfica II como requisito parcial à conclusão do Curso de Bacharelado em Literatura Italiana, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná. Orientador: Prof. Luiz Ernani Fritoli CURITIBA 2005 1 A todos aqueles que souberam ceder seu tempo quando eu vinha, incansável, com a “história” de gula. Aos pequenos e grandes que ocupam lugar especial no meu coração. 2 Ora, em primeiro lugar, é necessária muita força de vontade para sair da mesa ainda com apetite; enquanto essa necessidade persiste, um bocado atrai outro com uma atração irresistível, e em geral se come enquanto se tem fome, a despeito dos médicos, e mesmo a exemplo dos médicos. Brillat-Savarin em A Fisiologia do Gosto Ai de mim! da filosofia, Medicina, jurisprudência, E mísero eu! da teologia O estudo fiz, com máxima insistência. Pobre simplório, aqui estou E sábio como dantes sou! Johann Wolfgang von Goethe em Fausto A serpente disse então à mulher: “Não, não morrereis! Mas Deus sabe que, no dia em que dele comerdes, vossos olhos se abrirão e vós sereis como deuses, versados no bem e no mal.” Gênesis 2,3 3 SUMÁRIO Resumo ................................................................................................................................VI Riassunto ...........................................................................................................................VII 1. Introdução ........................................................................................................................ 1 1.1 As gulas ............................................................................................................... 3 2. A idéia de gula ................................................................................................................. 5 3. A gula física .................................................................................................................... 14 3.1 As imagens da gula punida ............................................................................. 15 4. A gula intelectual ........................................................................................................... 23 5. A gula espiritual ............................................................................................................ 31 5.1 Lúcifer X Satanás ............................................................................................ 31 5.2 Incontinência de Lúcifer ................................................................................. 34 6. Conclusão ....................................................................................................................... 38 7. Referências Bibliográficas ............................................................................................ 40 4 RESUMO Análise interpretativa dos cantos VI, XXVI, XXXIII e XXXIV da cântica do Inferno da obra A Divina Comédia, de Dante Alighieri, tendo como enfoque crítico a maneira como o que se entende como pecado da gula pode ter variantes dentro da cântica. Com base em teorias filosóficas, de Aristóteles, e teológicas, de São Tomás de Aquino e Santo Agostinho, tem-se como propósito defender que a obra em questão oferece espaço na interpretação da sutil linha de separação que divide os pecados elencados pela tradição católica. Discorre sobre as mais relevantes contribuições dos pensadores para a questão ética dos pecados, bem como de suas interpretações como sendo estes originários da essência do Mal. Apóia-se em reflexões pessoais bem como naquelas geradas pela leitura de cânones da filosofia e da literatura. Palavras-chave: Gula, Incontinência, Conhecimento e Poder. 5 RIASSUNTO Analisi interpretativa dei canti VI, XXVI, XXXIII e XXXIV della cantica dell’Inferno del libro La Divina Commedia, di Dante Alighieri, avendo come centro la maniera come quello che si capisce come peccato della gola può avere varazioni dentro la cantica. Basandosi sulle teorie filosofiche, di Aristotele, e teologiche, di Tommaso D’Aquino e Agostino, ci si propone a difendere che quest’opera offre spazio nell’interpretazione della sottile linea che divide i peccati elencati dalla tradizione cattolica. Si discorre sulle più rilevanti contribuzioni dei pensatori per la questione etica dei peccati così come delle loro interpretazioni come oriundi dalla essenza del Male. Ci si appoggia su riflessioni personali nonché in quelle venute dalla lettura dei classici della filosofia e della letteratura. Parole-chiavi: Gola, Incontinenza, Conoscenza e Potere. 6 Introdução Tratar da Divina Comédia, de Dante Alighieri, depois de sete séculos da sua composição ainda é um desafio a quem se propõe a estudá-la, uma vez que a obra em sua extensão retrata a essência do homem como um todo e os inúmeros processos ambíguos e cheios de desejo da natureza humana, seja em relação ao corpo seja em relação ao espírito. Com isso, pensar uma obra tão importante para a formação do imaginário ocidental como a Divina Comédia e não atentar para os preceitos ético- religiosos abordados ali seria um tanto quanto superficial no que diz respeito à constante busca de parâmetros à qual um estudioso de literatura, seja ela qual for, está fadado a incorrer. Claro que esses preceitos não são os únicos aspectos relevantes dentro da obra, dada a importância da sua preocupação histórica e política. Mas sendo Dante também um homem atento aos rumos éticos da humanidade, é de se reconhecer que dentro do poema existe uma grande preocupação com a busca do engrandecimento da alma. Por se tratar de uma obra de cunho altamente religioso e com fundamentações filosóficas, é indispensável que se tenha como parâmetro de análise as concepções que essas correntes de pensamento – a religiosa e a filosófica – agregam ao imaginário do autor Dante Alighieri, para que a partir daí se possa enxergar as delimitações e as intersecções entre os pecados dos quais o autor se vale para classificar e separar os pecadores dentro do Inferno, bem como no Purgatório. Para tanto, uma visão mais abrangente das idéias do filósofo clássico Aristóteles se faz necessária, para que ao menos as classificações dos erros – e não ainda “pecados”, dada a distância temporal e cultural desse filósofo – de incontinência, violência ou fraude se façam claras. Para complementar na compreensão da visão de Dante, faz-se necessário o entendimento de pecado como o concebe a tradição católica, ou seja, a partir de textos de seus doutores de onde se conclui que pecado é uma fraqueza moral, ou “um ato insuficiente de vontade, uma escolha corrupta1”. _____________________________ 1 - AGOSTINHO, Santo. Confissões. 9ª Edição. São Paulo: Paulus, 1984. Pág 14. 7 A partir da história pessoal de Dante, pode-se considerar que a Divina Comédia é também uma obra de caráter político já que o autor se valeu dela para julgar e destinar seus amigos e desafetos – históricos ou pessoais – aos diferentes espaços destinados à justiça divina. No entanto, a obra dá conta dos males e dos vícios dos homens em geral e não apenas aqueles mal vistos por Dante, assim como da equivalência de suas penas de acordo com a classificação, seja por incontinência, por violência ou por fraude. É justamente no Inferno que a representação dos pecados ocorre da forma mais intrigante, já que o Purgatório está reservado à penitência e à remissão dos pecadores. Tal representação, por querer ilustrar da forma mais fiel cada um dos vícios humanos, acaba dando margem ao aparecimento de uma ambigüidade na relação entre os pecados e ao enfraquecimento da linha de divisão que os separa e os classifica. Faz-se aqui necessária a lembrança de que a Igreja não hierarquiza os pecados, pelo simples fato de que o ato de pecar de alguma maneira sempre dá margem para que outros pecados surjam2. É essa ambigüidade no Inferno o alvo do presente estudo, principalmente no que diz respeito ao pecado da gula. Devemos atentar para o período em que a obra foi escrita, ou seja, inicio do século XIV, apesar do longo alcance temporal conseguido pela sua relevância e sua profundidade ao tratar do tema “essência humana”. Nesse tempo, mesmo considerando o fato de já Santo Agostinho considerar o bom uso do livre arbítrio para se distanciar do pecado, a idéia de pecar era intimamente ligada ao poder de convencimento do mal, estando o homem sujeito às tentações concretas do mundo material, as quais representavam diretamente o Diabo. No entardecer da Idade Média, o mundo das aparências é um mundo ao avesso: real é somente o transcendente, o espiritual, o invisível. O espiritual tem a corporeidade da matéria e é o centro de irradiações benéficas ou nefastas. (NOGUEIRA, pág. 95) _____________________________ 2 – Ver TOMÁS de Aquino, Santo. Sobre o Ensino (De Magistro). Os sete pecados capitais. 1ª Edição. São Paulo: Martins Fontes, 2001. 8 Com isso, pensar o pecado da gula projetado no período em que foi escrita a Divina Comédia é ligá-lo à imagem de que por trás de uma inofensiva mesa farta está uma essência maligna que impele o homem a extrapolar os limites da saciedade física até o ponto em que não se pode mais comer por, realmente, falta de espaço. Cabe ressaltar que a distância temporal da obra a se analisar determina que os valores atuais de conduta não sejam projetados na visão do autor, segundo a qual o que prevalece é a eterna luta maniqueísta do Bem contra o Mal, claro que com aspectos psicológicos envolvidos, mas não com a complexidade da psicologia contemporânea na qual é comum considerar as fraquezas humanas correspondentes a definições como trauma, carência afetiva, transferência, etc. 1.1 As gulas Inicialmente definido como apetite desordenado de comida e bebida e uma degeneração do instinto que leva o homem a se alimentar de acordo com as suas necessidades de existência3, a gula se encaixa na classificação de pecado por incontinência, uma vez que representa um não-domínio das vontades humanas, as quais são induzidas pela própria natureza do homem. Os gulosos, segundo os parâmetros éticos citados, pecam por não fazerem uso do excedente de comida que ingerem. Assim agiu Ciacco, glutão punido dentro do terceiro círculo do Inferno dantesco a ser analisado no capítulo destinado à gula física. Já por uma outra ótica, pode-se entender tais vontades humanas não apenas como físicas, mas também como desejos intelectuais. Estes tão naturais à essência humana como as próprias necessidades físicas e vistos como indispensáveis para a aproximação do homem com Deus dentro da obra a ser discutida, assim como na doutrina Católica. Com isso, propõe-se também pensar e interpretar até onde aqueles que buscam desenfreadamente por sabedoria se utilizam do conhecimento adquirido, _____________________________ 3 - CITTÀ DEL VATICANO. Enciclopedia Cattolica. Prima Edizione. Firenze: Sansoni Editore, 1951. Tomo VI. 9 sendo este conhecimento direcionado ou não à busca da razão divina. Para tal, será usada a figura do personagem e herói grego Ulisses e como Dante escolheu puni-lo dentro do oitavo círculo do Inferno, aquele destinado aos conselheiros fraudulentos. Mas entrando em uma outra esfera, é possível enxergar uma gula espiritual quando analisados os atos do precursor de todos os males, o anjo-caído da tradição católica: Lúcifer. Para tal, propõe-se uma análise da maneira como se dá uma possível intersecção entre os pecados da gula e da soberba a partir da idéia de gula como exagero. Para isso, a imagem do personagem Lúcifer é usada como parâmetro devido aos seus atos que geraram a grande queda e sua condenação no fundo da cidade infernal. Contudo, abordar um aspecto da natureza humana já pré-julgado por um autor, neste caso Dante Alighieri, não necessariamente limita as possibilidades de interpretação de quem o estuda, uma vez que o pecado da gula pode ir além de uma simples satisfação física. O que se visa a concluir é que tal pecado pode ter mais de uma face dentro da obra, tanto na perspectiva do autor como em uma interpretação posterior. Com isso centra-se a discussão das diferentes representações da “fome” ou “sede” exageradas, sejam estas no sentido físico, intelectual ou espiritual. Além disso, serão discutidas as considerações do principal juiz da obra, que diferentemente da lógica cristã que rege o poema, é o próprio autor Dante Alighieri. 10

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Monografia apresentada à disciplina. Orientação . obra A Divina Comédia, de Dante Alighieri, tendo como enfoque crítico a maneira como o.
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