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SUMÁRIO HELOÍSA, ISOLDA E OUTRAS DAMAS NO SÉCULO XII Introdução Alienor Maria Madalena Heloísa Isolda Juette Dorée d’Amour e a Fênix A LEMBRANÇA DAS ANCESTRAIS Servir os mortos 1.Os mortos na casa 2.As mulheres e os mortos 3.Escrever os mortos 4.Memória das damas Esposas e concubinas 1.Genealogia de um elogio 2.A perturbação que vem das mulheres 3.As damas 4.As amigas 5.Arlette O poder das damas 1.Ambiente 2.O testemunho 3.As deusas-mães 4.O casal 5.As viúvas Genealogias EVA E OS PADRES Introdução Os pecados das mulheres A queda Falar às mulheres Do amor Conclusão Sobre o autor HELOÍSA, ISOLDA E OUTRAS DAMAS NO SÉCULO XII Tradução Paulo Neves INTRODUÇÃO APRESENTO AQUI ALGUMAS NOTAS. São os frutos de uma investigação arriscada, longa e mesmo assim incompleta. Conduzia da melhor maneira que pude, querendo ver mais claramente quem eram no século XII, na França, essas mulheres chamadas damas por terem desposado um senhor, conhecer a sorte que lhes estava reservada em seu mundo, o mundo da nobreza, nas camadas superiores da sociedade brutal e refinada que chamamos feudal. Permaneci deliberadamente nessas alturas por serem as únicas iluminadas o suficiente. Mesmo aqui, no entanto, a obscuridade é espessa. O historiador avança penosamente num terreno difícil cujos limites não cessam de recuar diante de seus passos. Para ele, as damas desses tempos longínquos não têm rosto nem corpo. Ele tem o direito de imaginá-las, nos grandes desfiles da corte, vestidas de túnicas e de mantos semelhantes aos que cobrem as virgens e os santos nos pórticos e nos vitrais das igrejas. Mas a verdade corporal que túnicas e mantos deixavam a descoberto e envolviam escapará sempre a seu olhar. Com efeito, os artistas, da mesma forma que os poetas, não se preocupavam então com realismo. Representavam símbolos e se atinham a fórmulas convencionais. Não esperemos portanto descobrir a fisionomia particular dessas mulheres nas efígies muito raras, e são as das mais poderosas dentre elas que chegaram até nós. Não menos raros são os objetos que elas tiveram em suas mãos e que podemos ainda tocar. Onde estão os ornamentos que usaram, exceto algumas joias e pedaços de tecidos suntuosos vindos do Oriente com os quais teriam se enfeitado, antes de os oferecerem, como esmola, para enrolar as sagradas relíquias nos relicários? Nenhuma imagem concreta, portanto. Ou quase nenhuma. Toda informação provém do escrito. Parti portanto dos textos, dos poucos textos que nos restam dessa época, tentando separar no início da investigação os traços de algumas figuras de mulheres. Sem ilusão. Com efeito, já é difícil fazer-se uma ideia dos homens, e dos mais célebres, daqueles que transformaram o mundo. Francisco de Assis, Filipe Augusto, e mesmo são Luís, apesar do que escreveu Joinville, o que sabemos de suas personalidades? E as mulheres então, de quem se falou muito menos? Para nós elas serão sempre sombras indecisas, sem contorno, sem profundidade, sem relevo. Faço de imediato essa advertência. O que procuro mostrar não é o realmente vivido. Inacessível. Procuro mostrar reflexos, o que testemunhos escritos refletem. Confio no que eles dizem. Se dizem a verdade ou não, não é isso que importa. O importante para mim é a imagem que oferecem de uma mulher e, por meio dela, das mulheres em geral, a imagem que o autor do texto fazia delas e quis passar aos que o escutaram. Ora, a imagem viva é inevitavelmente deformada nesse reflexo, e por duas razões. Primeiro, porque os escritos datados da época que estudo — e esse caráter, no espaço francês, não se alterou antes do final do século XIII — são todos oficiais, dirigidos a um público, jamais voltados para o íntimo; segundo, porque foram redigidos por homens. A escrita, a bela escrita, a que resistiu ao desgaste do tempo e que leio, só fixava falas importantes e em formas artificiais, o latim ou a linguagem sofisticada que se falava nas reuniões mundanas. Às vezes, por certo, foi lida privadamente — mas sempre em voz alta, mastigando-se as palavras — ao longo das galerias de um claustro, ou nos aposentos das damas, ou ainda naqueles recantos guarnecidos de livros onde alguns homens se dedicavam a recopiar frases ou a forjar novas. No entanto, todos esses textos foram feitos para ser declamados, e com frequência cantados, diante de um auditório. Todos, mesmo os destinados a divertir, os romances, as canções, os contos satíricos, tinham a função de ensinar. Não se preocupavam em descrever o que existia, tiravam da experiência cotidiana, e sem se proibirem de retificá-la, elementos que proporcionassem uma lição moral. Afirmando o que se devia saber ou acreditar, buscavam impor um conjunto de imagens exemplares. Afinal, da mesma forma que a escultura ou a pintura, também a literatura do século XII não é realista. Ela representa o que a sociedade quer e deve ser. Reconstituir um sistema de valores, eis tudo o que lhe é possível fazer a partir dessas palavras proferidas, repito, em voz alta e inteligível. E reconhecer nesse sistema o lugar designado às damas pelo poder masculino. Ao masculino, com efeito, pertence nessa sociedade tudo o que é oficial, tudo o que diz respeito ao público, a começar pela escrita. Mâle Moyen Âge [Idade Média masculina], L’homme médiéval, pelos títulos que deu a seus livros, o historiador confessa: somente os homens desse tempo são um pouco visíveis e eles lhe ocultam o resto, sobretudo as mulheres. Algumas aparecem de fato ali, mas representadas. Simbolicamente. Por homens, e por homens da Igreja em sua maior parte, portanto adstritos a não se aproximar muito delas. As damas do século XII sabiam escrever, e com certeza melhor que os cavaleiros, seus maridos ou seus irmãos. Algumas escreveram, e talvez algumas tenham escrito o que pensavam dos homens. Mas praticamente nada subsiste da escrita feminina. Resignemo-nos: nada aparece do feminino a não ser por intermédio do olhar dos homens. Mas será que no fundo as coisas mudaram tão radicalmente? Tanto ontem como hoje, a sociedade apenas mostra de si mesma o que julga conveniente exibir. No entanto, o que ela diz, e sobretudo talvez o que não diz, permite entrever suas estruturas. Reli textos portanto, esforçando-me por identificar-me com aqueles que os escreveram a fim de dissipar as ideias falsas que depois perturbaram seu sentido. Reli-os procurando esquecer, pois também sou um homem, a ideia que faço das mulheres, e talvez nem sempre o tenha conseguido. Para iluminar o campo de minha pesquisa, apresento aqui seis figuras de mulheres escolhidas entre as menos indistintas. Trata-se de um começo, útil. Um outro livro tratará da lembrança das ancestrais, tal como se conservava nas casas da alta nobreza: aparecerão assim outras imagens, mais vaporosas, precisando porém a imagem das damas que os cavaleiros se faziam naquele tempo. Proponho-me enfim examinar de perto, num terceiro volume, o que pensavam das mulheres os homens da Igreja que eram seus diretores de consciência e que procuravam arrancá-las de sua perversidade nativa. ALIENOR SOB A CÚPULA CENTRAL DA IGREJA DE FONTEVRAUD — era uma das mais vastas, das mais prestigiosas abadias de mulheres, na França do século XII —, veem-se hoje quatro estátuas jacentes, vestígios de antigos monumentos funerários. Três dessas estátuas são talhadas em calcário brando, a de Henrique Plantageneta, conde de Anjou e do Maine por seus antepassados paternos, duque da Normandia e rei da Inglaterra por seus antepassados maternos; a de seu filho e sucessor Ricardo Coração de Leão; a de Isabel de Angoulême, segunda mulher de João sem Terra, o irmão de Ricardo, que se tornou rei, por sua vez, em 1199. A quarta efígie, em madeira pintada, representa Alienor, herdeira do ducado de Aquitânia, esposa de Henrique, mãe de Ricardo e de João, que em 31 de março de 1204 morreu em Fontevraud, onde no fim da vida se fizera freira. O corpo dessa mulher está estendido sobre a laje, tal como estivera exposto no leito mortuário durante a cerimônia dos funerais. Está envolvido por inteiro nas dobras da túnica. Um véu comprime o rosto. Os traços deste são de uma pureza perfeita. Os olhos estão fechados. As mãos seguram um livro aberto. Diante desse corpo, desse rosto, a imaginação pode conceber o que quiser. Mas desse corpo, desse rosto quando eram vivos, a estátua jacente, admirável, nada diz de verdadeiro. Alienor estava morta havia muitos anos quando a estátua foi feita. Teria o escultor visto alguma vez com os próprios olhos a rainha? Na verdade, isso pouco importava: naquele tempo a arte funerária não se preocupava com a semelhança. Em sua plena serenidade, essa figura não pretendia reproduzir o que o olhar pudesse ter descoberto no catafalco, o corpo, o rosto de uma mulher de oitenta anos que havia se batido duramente contra a vida. O artista recebera a encomenda de mostrar o que seriam em sua plenitude esse corpo e esse rosto no dia da ressurreição dos mortos. Por conseguinte, ninguém jamais poderá avaliar o poder de sedução que a herdeira do ducado de Aquitânia possuía quando, em 1137, foi entregue a seu primeiro marido, o rei Luís VII da França. Ela contava então aproximadamente treze anos, ele, dezesseis. “Ele ardia de um amor apaixonado pela adolescente.” É o que relata, meio século mais tarde, Guilherme de Newburgh, um daqueles monges da Inglaterra que recompunham então, com grande habilidade, a sequência dos acontecimentos do tempo passado. Guilherme acrescenta: “O desejo do jovem Capeto foi aprisionado numa estreita rede”; “Nada de surpreendente, tamanhos eram os encantos
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